quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

A viagem

Era o tipo de viagem que gostaria de estar fazendo: um lugar qualquer, em que pudesse sentir frio e saudade. Uma pessoa muito querida, de preferência você, para que a saudade não fosse tão grande assim. E uma câmera  na mão pra imortalizar as nossas cores.
Você e eu e um imenso campo de girassóis. Ou ainda aquelas construções históricas e dignas de contos de fadas. Ou passeios de bicicleta às margens de um largo rio. Neve. Roupas pesadas. Gorros, luvas e cachecóis. E chocolate quente e você e eu debaixo dos lençóis.



Para completar, um passeio de trem ou de barco e beijos apaixonados naquela velha ponte. Nada poderia ser mais perfeito ou desejado nesse exato instante. Porque tudo o que eu queria era estar sozinha com você o mais longe possível da realidade.


Imagem: "Paris é uma festa...de amor", de Carlos Valença

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Dona Flor

Durante dois anos, teve dois namorados. Um que era e um que não era, mas pensava ser.
Florinda era uma moça bonita, jovem, de pele morena e olhos claros. Apaixonada pelo homem da sua vida. Até que seu caminho foi atravessado por um encosto. Nunca soube, na verdade, se o outro existiu de fato ou era imaginação.
O que aconteceu foi que quase deixou escapar o grande amor por uma nuvem que lhe embaçava os olhos. Tola.
Mas o que importa saber é que ela acordou. E se deu conta de que não tinha mais tempo a perder. Subiu no salto e não olhou mais pra trás. Rasgou carta, queimou foto e se desfez de todo e qualquer tipo de recordação daquele tempo que perdeu, que ficou pra trás. Matou e enterrou o passado que foi o maior presente de grego que a vida poderia dar a alguém.
E aí ninguém mais tirou o sorriso daquela mulher.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Carta para olhos pequenos

Foi tão bom te rever e sentir de novo aquele carinho. Me pareceu que todo o tempo que passamos afastados foram férias escolares e que retornamos ao que fora antes.
Ainda acho que não. Mas foi a impressão que eu tive.
Seus pequenos olhos e meu imenso sorriso diziam mais que qualquer palavra que pudéssemos inventar naquele instante. E eu não queria inventar mais nada, só reviver. Ou nem isso, acho que o que eu sempre quis, desde antes, era que nada tivesse mudado e que a vida tivesse seguido seu curso naturalmente, de idas e vindas lá e nós aqui.
Foi bom. Foi muito bom o nosso bom e velho abraço sem pressa, sem pudores, sem medos, sem exageros, sem nada além do que nos une desde o primeiro instante. Laços eternizados em caixas e mais caixas de papel que guardaram todas as nossas lágrimas, nossas razões pra sorrir ou pra chorar, ou nossos instantes de loucura.
E foram palavras, desenhos, traços desses invisíveis laços que estabelecemos num dia qualquer, com uma palavra qualquer, por um motivo qualquer. E hoje estamos aqui.
E foi bom te ver de novo. E não ter vontade de te olhar de lado nem de te jogar indiretas ou trocar ironias a cada frase. Mas foi vontade de te olhar de frente, falar abertamente e conversar. Porque os seus pequenos olhos são as janelas do seu imenso coração.
E as nossas lembranças são lindas. E ainda vão virar história. Pelas minhas palavras e os seus desenhos. Como tinha de ser.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Já não se sabe mais.

E aí já não se sabe mais quanto tempo ficou pra trás desde a última vez.
Tudo ainda parece distante e nublado demais pra se recordar assim, sem motivo. Ou pelo simples fato de não ter mais motivo. Nunca foi preciso ter motivo ou razão. Aliás, razão faltou desde a primeira vez. E na última não foi diferente.

E aí já não se sabe mais quanto tempo ficou pra trás desde a última vez.
As lembranças de um passado nem tão remoto assim passavam em lampejos como num filme amarelado pelo tempo, apático e monocromático. E nem tinha se passado tanto tempo assim. Faltava tempo. Sobrava tempo.

E aí já não se sabe mais quanto tempo ficou pra trás desde a última vez.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Era a saudade

Era a saudade que eu sentia que me prendia os pés ao chão. Que me podava os sonhos. Que me privava os sorrisos.
Era a saudade que eu sentia que não me deixava dormir. Que me torturava toda noite. Que me fazia prisioneiro.
Era a saudade que eu sentia que não me permitia alegrias nem tristezas. Que me paralisava as sensações. Que me tolhia os sentidos.
Era a saudade que eu sentia que não me deixava viver.