domingo, 28 de agosto de 2011

Sobra excesso.

Preciso ir, já não me caibo. Ando fora de mim. Sobrevivo.
E não é falta de amor nem de Deus nem de realização. Ao contrário, sou feliz em qualquer instância. O que me acomete é aquele bichinho da novidade que não me deixa em paz.
Faz tempo me cansei daqui, de procurar por mim onde não existo. Sou em vários aspectos, mas um vaziozinho na alma incomoda como grão de areia no sapato.
Faz sol, mas não dá praia. Não sobra chocolate em pó pro brigadeiro. A chuva cai cinza e ácida. As nuvens não formam castelos, mas prisões. Me afogo na ressaca que bateu no mar da minha vida, me revirando nas ondas atiradas às pedras da rotina. E não tem nem uma brisa que me leve sem destino.
Não é falta de Amor nem de Deus nem de solidão. É excesso de querer, que não cabe em realizar. É tudo extremo. É muito desejo no coração e pouca hora no relógio. É muita ideia na cabeça e pouca câmera na mão. É muito sonho no peito e pouca asa no pé. É muita vida transbordando de uma vez.
Mas não é falta. É excesso.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Você não era assim...

Tudo o que eu me lembro da nossa distante infância se resume a chatices e implicâncias. Mas nada que não seja normal pra crianças daquela idade que tivemos.

Tudo o que eu me lembro do tempo que passei longe de você a primeira vez é que eu nem me lembrava de você, na verdade. Você não me sobrava nem faltava. Já nem sabia mais da sua existência pra gastar toda a sinceridade que habita em mim.

Tudo o que eu me lembro da primeira vez que te revi foi a vergonha de estar perto de você e a vontade de dizer que tudo não passou de implicância infantil e que agora você parecia outra pessoa, completamente diferente e amadurecida e adolescente. E foi nessa hora, pela primeira vez, que eu realmente me dei conta de quem era você. E de que você existia. E que, de alguma forma, fazia parte da minha vida. E eu queria que fizesse mais.

Tudo o que eu me lembro do tempo que passei longe de você a segunda vez é um vazio que me apertava eu não sabia onde nem quando nem como, mas que me tirava o ar algumas vezes. E mesmo não sabendo que era falta de você, alguma coisa dentro de mim parecia ter perdido um pedaço. E era saudade do que não fomos e não sabíamos que iríamos ser.

Tudo o que eu me lembro da segunda vez que te revi é que as coisas se atropelaram todas e se sobrepuseram e de repente estávamos abraçados, dois pra lá dois pra cá e conversas ao pé do ouvido. E de repente estreitamos os laços que nunca nem soubemos ter. E aí já não tinha mais pra onde fugir, voltar ou correr. O que o destino traçara estava feito e não era a gente que poderia mudar ou não querer ou tentar desfazer.

Tudo o que eu me lembro da primeira vez que você mentiu pra mim é que foi doce. E tão fofo e tão sutil que nem parecia mentira. E eu caí direitinho, como todo ser humano adolescente e frágil sempre cai, mesmo sem saber e muito menos sem achar que caiu. Mas eu caí. E achava que estava no comando da situação, mas (ah, quanta ingenuidade!), é claro que não.

Tudo o que eu me lembro das vezes que se seguiram e que você mentiu pra mim é que a sua mentira continuava doce. E fofa e sutil. E eu continuava achando que o mundo era cor-de-rosa quando eu estava do seu lado. E tinha certeza de que era por isso. Mas a verdade é que ele permanecia azul e só eu que não queria ver.

Tudo o que eu me lembro da última vez que você mentiu pra mim é que doeu muito mais que toda a saudade que eu tinha sentido. E muito mais do que se você não tivesse mentido. E muito mais do que toda a dor que eu já tinha experimentado e conhecido e sentido até então. E foi difícil de curar, de esquecer, de cicatrizar. Mas cicatrizou.

Tudo o que eu me lembro da última vez que eu te vi é que eu já nem lembro mais o que eu sentia. Nem sei se ainda sentia alguma coisa quando vi você passar. Porque você já tinha mudado outra vez e não cabia naquele você que era a imagem sua que eu tinha guardado, ainda docemente, mesmo depois de todas as suas sutis mentiras. E porque eu achava que você tinha carregado toda a minha capacidade de sentir pra longe, mas tão longe que ela nunca mais poderia voltar. Mas voltou.

Tudo o que eu me lembro da última vez que eu te vi passar é que você já não significava mais o mesmo pra mim. E já não fazia mais parte da minha vida. E nem fazia parte da minha saudade. Mas permanecia em algum lugar do meu passado, em preto e branco, como uma lembrança que existiu e que parou por ali.

Tudo o que eu me lembro da última vez que eu me dirigi a você é a percepção que eu tive do que você era. Você não era nem metade do que eu achava que era. Na verdade, estava bem longe de ser. Você era, em toda a sua inteiridade, uma doce mentira que me acalentava e me aquecia o coração, ainda que nada fosse verdade. Mas era uma mentira. 

Tudo o que eu me lembro da última vez que eu pensei em você é que eu tinha pena. Ou um sentimento qualquer daquela coisa inacabada que a gente resolveu deixar pra lá. Porque se nunca começou, como é que poderia ter fim?

Tudo oq ue eu me lembro de você é que, em todas as minhas lembranças, ainda as que foram mentiras, você não era assim.