quinta-feira, 24 de junho de 2010

L'Archidiacre

Ele sempre fora sério, centrado, focado nas coisas de Deus. Filho único, logo cedo abandonou a casa para ir ao seminário. Ainda padre, já à cidade, e celebrando missas na Catedral, recebeu uma encomenda inesperada certa noite em meio a um temporal. Um pequeno embrulho esquecido às longas portas da igreja chamou sua atenção. E o recolheu.
Em seu quarto, atrás da sacristia, abriu o pacote que se remexia pensando se tratar de um pequeno animal. Mesmo tendo aberto o embrulho, ainda demorou um tempo até mudar de opinião. O ser que o fitava com olhos lacrimosos era um pequeno bebê, abandonado por alguém que teve a mesma reação que o jovem padre ao vê-lo: horror.

Com o passar do tempo, as deformações da criança lhe pareciam normais e ele a tratava com carinho. Depois de uma certa idade, já alfabetizado e exímio leitor, já que nunca saíra da Catedral, o padre nomeou o adolescente 'Tocador de Sinos da Catedral'. Não por amor. Também nem por obrigação. Mas talvez por pena.
Alguns anos maias tarde, foi ordenado Bispo. E os sinos da igreja soaram jubilosos pelas mãos de seu pupilo. O que ele não esperava era que, na estação seguinte, seus instintos carnais há tanto tempo adormecidos seriam despertados na Festa dos Tolos...