quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

A viagem

Era o tipo de viagem que gostaria de estar fazendo: um lugar qualquer, em que pudesse sentir frio e saudade. Uma pessoa muito querida, de preferência você, para que a saudade não fosse tão grande assim. E uma câmera  na mão pra imortalizar as nossas cores.
Você e eu e um imenso campo de girassóis. Ou ainda aquelas construções históricas e dignas de contos de fadas. Ou passeios de bicicleta às margens de um largo rio. Neve. Roupas pesadas. Gorros, luvas e cachecóis. E chocolate quente e você e eu debaixo dos lençóis.



Para completar, um passeio de trem ou de barco e beijos apaixonados naquela velha ponte. Nada poderia ser mais perfeito ou desejado nesse exato instante. Porque tudo o que eu queria era estar sozinha com você o mais longe possível da realidade.


Imagem: "Paris é uma festa...de amor", de Carlos Valença

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Dona Flor

Durante dois anos, teve dois namorados. Um que era e um que não era, mas pensava ser.
Florinda era uma moça bonita, jovem, de pele morena e olhos claros. Apaixonada pelo homem da sua vida. Até que seu caminho foi atravessado por um encosto. Nunca soube, na verdade, se o outro existiu de fato ou era imaginação.
O que aconteceu foi que quase deixou escapar o grande amor por uma nuvem que lhe embaçava os olhos. Tola.
Mas o que importa saber é que ela acordou. E se deu conta de que não tinha mais tempo a perder. Subiu no salto e não olhou mais pra trás. Rasgou carta, queimou foto e se desfez de todo e qualquer tipo de recordação daquele tempo que perdeu, que ficou pra trás. Matou e enterrou o passado que foi o maior presente de grego que a vida poderia dar a alguém.
E aí ninguém mais tirou o sorriso daquela mulher.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Carta para olhos pequenos

Foi tão bom te rever e sentir de novo aquele carinho. Me pareceu que todo o tempo que passamos afastados foram férias escolares e que retornamos ao que fora antes.
Ainda acho que não. Mas foi a impressão que eu tive.
Seus pequenos olhos e meu imenso sorriso diziam mais que qualquer palavra que pudéssemos inventar naquele instante. E eu não queria inventar mais nada, só reviver. Ou nem isso, acho que o que eu sempre quis, desde antes, era que nada tivesse mudado e que a vida tivesse seguido seu curso naturalmente, de idas e vindas lá e nós aqui.
Foi bom. Foi muito bom o nosso bom e velho abraço sem pressa, sem pudores, sem medos, sem exageros, sem nada além do que nos une desde o primeiro instante. Laços eternizados em caixas e mais caixas de papel que guardaram todas as nossas lágrimas, nossas razões pra sorrir ou pra chorar, ou nossos instantes de loucura.
E foram palavras, desenhos, traços desses invisíveis laços que estabelecemos num dia qualquer, com uma palavra qualquer, por um motivo qualquer. E hoje estamos aqui.
E foi bom te ver de novo. E não ter vontade de te olhar de lado nem de te jogar indiretas ou trocar ironias a cada frase. Mas foi vontade de te olhar de frente, falar abertamente e conversar. Porque os seus pequenos olhos são as janelas do seu imenso coração.
E as nossas lembranças são lindas. E ainda vão virar história. Pelas minhas palavras e os seus desenhos. Como tinha de ser.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Já não se sabe mais.

E aí já não se sabe mais quanto tempo ficou pra trás desde a última vez.
Tudo ainda parece distante e nublado demais pra se recordar assim, sem motivo. Ou pelo simples fato de não ter mais motivo. Nunca foi preciso ter motivo ou razão. Aliás, razão faltou desde a primeira vez. E na última não foi diferente.

E aí já não se sabe mais quanto tempo ficou pra trás desde a última vez.
As lembranças de um passado nem tão remoto assim passavam em lampejos como num filme amarelado pelo tempo, apático e monocromático. E nem tinha se passado tanto tempo assim. Faltava tempo. Sobrava tempo.

E aí já não se sabe mais quanto tempo ficou pra trás desde a última vez.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Era a saudade

Era a saudade que eu sentia que me prendia os pés ao chão. Que me podava os sonhos. Que me privava os sorrisos.
Era a saudade que eu sentia que não me deixava dormir. Que me torturava toda noite. Que me fazia prisioneiro.
Era a saudade que eu sentia que não me permitia alegrias nem tristezas. Que me paralisava as sensações. Que me tolhia os sentidos.
Era a saudade que eu sentia que não me deixava viver.

sábado, 27 de novembro de 2010

Carta para o velho, antigo e ultrapassado.

Queridinho,

Te odeio como antes.
Mas já não quero mais reatar ou fingir que nada aconteceu.
Não adianta, cada passo que tento dar a frente é como se você me empurrasse abismo abaixo sem tempo de voltar atrás.
Te odeio mais que antes.
E é uma raiva tão latente que me ata os pés e mãos e venda os olhos e não permite esquecer.
E a impressão que eu tenho é de que você acha tudo isso divertido e não vai parar até o fim.
Só que o fim está próximo.
E você, no seu ofício de ofender e discordar, não pode perceber.
O fim está próximo.
O jogo acabou.
E foi você quem perdeu.

Com um restinho de pena e todo o meu desdém,
A Dona da História

domingo, 24 de outubro de 2010

Carta para o meu primeiro amor (correspondido)

Quando nos conhecemos, eu era muito nova pra saber o que é o amor. Mas no instante em que nossos olhares se cruzaram no meio daquela multidão, eu tive certeza de que era com você que eu ia descobrir.
Éramos dois adolescentes, vivíamos em um mundo colorido de conto-de-fada. Tínhamos um ao outro e não precisávamos de mais nada. E aí veio a realidade.
Vivíamos em contextos diferentes. Eu terminando o colégio e você já começando a faculdade. E aí veio a distância. Mas, até então, nada que um telefonema ou uma mensagem de texto vez ou outra não resolvessem. Até uma carta eu me lembro de ter escrito e mandado, à moda antiga, pelo correio, pra sua casa. E aí vieram as responsabilidades.
E, aos poucos, fomos perdendo o pouco contato que tivemos. E começamos a fazer outros planos, ver o mundo de outra maneira e seguir caminhos completamente diferentes do que imaginamos. E aí vieram as dúvidas.
Mesmo à distância, e já sem contato, duvidamos que conseguiríamos. E aí veio a fraqueza. 
E, de fato, desistimos. E fizemos outros planos. E nos esquecemos um do outro. E aí veio a saudade.
Muito tempo depois, por obra do acaso ou do divino, tivemos oportunidade de trocar meia dúzia de palavras. E até hoje me lembro da carta que você nunca respondeu, apesar de tantas promessas... E aí veio a lembrança.
E toda vez que ouço aquela música ou vou àquele lugar, é de você que eu me lembro. E é assim que tem que ser até que venham as próximas sensações.


Em algum lugar do meu coração você ainda é o mesmo.

A quermesse

Tudo começou na quermesse. A lua já ia alta no céu e o forró aquecia a noite fria. Regados a alguns copos de quentão, os três amigos avistaram as três amigas e resolveram 'se enturmar'.
A aproximação foi sutil e, antes do final de seus copos, os três meninos já tinham suas professoras particulares de forró. Dançaram e riram, descompromissados, até o sol raiar. Trocaram telefones e promessas de reencontro.
E como toda boa quermesse, no último dia estava lotada. Curiosamente, se encontraram mais uma vez. E a grande surpresa foi ela estar sem as amigas. Ainda assim, se divertiu com os três rapazes, dessa vez sem forró, mas com muito quentão e sorrisos.
A noite terminou com o nascer do sol e muitas gargalhadas. Demorou pra ela se dar conta do que estava acontecendo, mas ele não parava de elogiá-la e querer estar sempre perto. E ela percebeu que sentia o mesmo.
Quando notaram, estavam sozinhos. E, por um instante, seus sorrisos se juntaram em apenas um.
Desde então, todo ano voltam àquela quermesse pra comemorar o que nasceu dali.

sábado, 23 de outubro de 2010

zéfiní

acabou o samba.
acabou a carne, a cerveja, a água pra botar no feijão.
acabou a farofa, o molho, o repolho.
acabou a salada e a sobremesa.
acabou a tarde.
acabou o sol, o céu azul e o passarinho cantando.
acabou o vento, a nuvem, a ferrugem.
acabou a graça e a praça.
acabou.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

~Carta para os meus pensamentos

Eu sempre soube que não seria adeus. Talvez, tivesse sido, hoje fosse mais simples seguir em frente. Os caminhos sempre foram entrelaçados, tanto a ponto de os laços se metamorfosearem em nós cegos que nenhum mortal conseguiria desatar. E não há quem, no mundo, me consiga fazer esquecer você e o tudo o que você representa pra mim.
Eu tenho em você mais que um reflexo, ainda que invertido, meu. Tenho como que uma parte de mim que fugiu antes que eu percebesse e reapareceu com tamanha doçura no brilho do seu olhar que nem se mede. Eu tenho na sua mão meu apoio e no seu braço o meu melhor abraço. O seu sorriso é sempre o meu sorriso. E a sua tormenta, causa e consequência da minha dor.
Eu sempre soube que não seria adeus, mas algum tipo de impulso que nos aproximaria as almas com mais intensidade.

domingo, 19 de setembro de 2010

~dos quereres insanos

Eu quero! Quero de verdade. Quero como nunca quis até então. Quero com o corpo. Quero com a mente. Quero com a alma. Quero com o coração. Eu quero! Quero sua mão na minha. Quero seu abraço. Quero seu perfume entranhado na minha pele. Quero seu gosto misturado ao meu. Quero seu prazer de estar comigo. Quero ser quem eu só sou quando estou com você. Quero saber o que é te sentir. Quero morar em seus olhos. Quero ser a razão do seu sorriso. Quero sonhar o seu sonho mais lindo. Eu quero você!

sábado, 18 de setembro de 2010

Das pequenas irritações cotidianas

Discutem. Ela desliga o telefone com raiva e tem vontade de jogá-lo na parede. O telefone.
Sente como se tudo o que ela falasse tivesse sido em vão, perda de tempo, e que uma parede talvez tivesse tirado mais proveito do tempo perdido com falácias infinitas. Não adiantaria pedir desculpas, ele conseguira destruir o restante de alegria que o dia guardava pra ela.
Já chovia desde cedo e ela estava cheia de coisas pendentes pra resolver. Pensava em relaxar, sair pra um passeio romântico ou simplesmente pra almoçar e jogar um pouco de conversa fora. Mas não...
Resolveu esquecer o que ouvira e pensar um pouco nela mesma. Foi tomar um banho quente, fazer as unhas e recomeçar a biografia que andava tentando ler fazia um tempo, mas não conseguia sair da primeira página.
Tiraria o dia inteiro para cuidar dela, do seu coração, da sua alma, das suas coisas. Faria orações por quem precisasse e leria textos que sabia que gostaria. Com as unhas coloridas e a pele hidratada, seria uma nova mulher e mergulharia dentro de si mesma.
Somente ela sabia o que precisava para se alegrar. E não pouparia esforços para terminar o dia sorrindo.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Maturidade

Eu sou metade do que sempre imaginei ser quando chegasse até aqui. Boa parte das conquistas que esperava alcançar, já carrego comigo.
Mas algo ainda me falta.
Em metade de mim cabe um vazio que nem o que sobra da minha outra metade completa é capaz de preencher.
Sou meia asa aberta, preciso de impulso, ainda, para voar.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Gelo.

Era a segunda vez em três dias que me recusava um abraço. Mudava as feições como quem sente tristeza ao receber tamanho gesto de afeição, indesejado. Parecia envolvida em meus braços por obrigação. E repudiava qualquer sensação de bem estar que pudesse ousar perpassar sua mente. A frieza com que largava seu corpo ao meu corroía o fundo de minha alma. E o vazio que carregava no peito refletia em mim. Sua tristeza era perceptível somente a quem a conhecesse profundamente, como eu supunha conhecer. E ela nunca dissera o contrário. Seu coração era como pedra de gelo que não derretia, parecia congelar tudo o que tocasse. Mas o meu coração permanecia lá, intocável. Pronto para aquecer e modelar o dela.

domingo, 29 de agosto de 2010

O bilhete

e depois de tanto tempo
a cada dia que passa eu descubro um motivo novo pra me apaixonar por você
cada gesto, o jeito de olhar, o carinho, o cuidado, a atenção... tudo. tudo me dá vontade de te querer cada vez mais perto. cada vez mais pra sempre. cada vez mais meu.

Marionete.

Eu sou uma grande persona. Uma máscara. Uma personagem. Nem tudo o que você vê é como parece ser. Não se assuste se você descobrir que era tudo um truque de ilusionismo barato, só pra te convencer.
Eu sou uma esfinge. Ainda que te devore, você não vai me decifrar. Os segredos ocultos no interior dos meus olhos só são visíveis por dentro. Existo de dentro pra fora.
Eu sou uma farsa. Tudo o que você vê é mentira. E esse belo corpo? Mera carcaça. E essa voz doce? Disfarce. Esse sorriso escancarado? Engano.
Eu sou um grande erro. Aquele que cruzar o meu caminho não terá perdão jamais. Desgraçará a sua vida e não terá retorno. Nunca mais será o mesmo aquele que fitar meus olhos. Sucumbirá o desavisado que sorver o meu veneno.
Eu sou uma gárgula. Aprisionada ao meu coração de pedra, não sei amar e não permito aos que se aproximam conhecerem o doce sabor da liberdade. Vivo a carregar a dor de minhas pesadas asas de pedra que não me permitem voar.
Eu sou marionete embolada na estante. Esquecida pelo destino no fundo do baú com as cordas cortadas pra nunca mais sair do lugar.

sábado, 28 de agosto de 2010

Despedida...

Foi como cena de cinema. Passaram horas conversando embaixo da árvore como se não existisse no mundo nada além dos dois e seus pequenos grandes problemas.
Já não trocavam mais sorrisos, só dividiam uma angústia silenciosa que culminava em lágrimas e apertava os corações.
E no que seria uma despedida, ele fitou o céu nublado enquanto ela se desmontava a um canto da calçada. Mudos. Ninguém precisava falar. Pareciam ouvir o pensamento um do outro. Ou mais que isso: pensavam (e sentiam) a mesma coisa.
Mas apesar de toda a tristeza, no fundo, sabiam que não era o fim.

Carta para minha Estrela Guia

Sempre que posso, fico olhando o céu como uma forma de me lembrar da poesia. E tem feito noites lindas! Não sei se você tem tido tempo pra observar...
Hoje, em especial, depois de toda a correria desse período que insiste em não terminar, e de toda essa responsabilidade que vem junto com o 'crescer', me fez tão bem olhar aquele céu todo pintadinho de estrelas... e a primeira pessoa que eu lembrei quando vi aquele monte de luzinhas brilhando foi você.
E tudo o que eu mais quis naquele momento foi jogar o mundo pro alto e passar a noite abraçada com você em qualquer lugar longe daqui em que pudéssemos ver as estrelas e nada mais. E eu senti uma paz tão grande, só de pensar em você... que não sei explicar! Só queria dizer o quanto eu te amo e o quanto você é importante na minha vida. Espero poder, de fato, passar o resto dela do seu lado e construir uma realidade que seja fruto dos sonhos lindos que eu tenho hoje. E que esses sonhos sejam como as estrelas: que continuem a brilhar, mesmo depois de realizados.
Eu te amo!

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Luto!

Luto
contra o que sinto
contra o que vejo
contra o que insiste em me corroer por dentro
os sentidos e as certezas
a escuridão e a clareza
a força e toda a minha surreal fraqueza
o medo e toda a sua doce beleza

Luto
pra não ser mais igual ao que fui
pra não cair do abismo em que me encontro à beira
pra buscar a luz no fim do túnel que não vejo
pra não me perder por entre as árvores secas do caminho que percorro
pra voar sem as asas de cera que roubei de Ícaro
pra ir além e alcançar o infinito dos teus olhos mais uma vez.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Entardecer


vi as cores do teu coração entardecerem
vi as dores do teu coração adormecerem
vi as asas do teu coração se abrirem
e alçarem o vôo mais alto que jamais imaginaram
.
vi a luz brilhar do fundo da tua alma
vi o sol se refletir nos teus belos olhos
senti o ar que respiravas calmamente
teu coração pulsava carinhosamente
.
eu vi a dor se dissipar da tua face
eu vi teu corpo repousar por sobre as flores
eu vi a paz tomando conta do teu ser
eu vi o mundo se espelhar na tua calma.


quadro do caro amigo Carlos Valença

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

A decisão

- Joguei tudo pro alto. Desisti. Foge comigo?
- O que?
- Larguei tudo. Não tô cabendo mais aqui. Foge comigo? Vamos pra outro lugar.
- Isso é loucura!
- Eu sei! Mas por essa loucura que eu experimentei a liberdade. Vem, foge comigo!
- Não posso! E a vida que eu construí aqui? Família, casa, emprego... Não dá pra largar tudo agora.
- Clara, para com isso. É tudo o que você sempre quis, sair dessa prisão que se tornou a sua vida. Vem comigo.
- Não fala assim, Deco.
- Mas é verdade, Clara. Você é maior que tudo isso e também já não cabe mais aqui. Vamos embora desse lugar. Vem comigo, Clara! O mundo é nosso!
- Deco, bota esse pé no chão. Como a gente vai viver fora daqui? Sem lugar pra morar, sem conhecer ninguém, sem dinheiro... Deco, para de agir como criança. Você não tem mais idade pra isso. Me escuta...
- Me escuta você, Clara: cadê aquela menina sonhadora que sempre quis ser feliz? Pra onde foi a sua coragem? A sua vontade, Clara? O seu desejo de ser feliz? Você sabe que não é essa vida que você tá levando que vai te fazer feliz. Esse lugar é pequeno demais pra você, Clara. Você merece muito mais.
-  Deco... não fala assim. Eu... eu sou feliz aqui. Apesar de alguns problemas... eu... eu sou feliz, sim.
- Clara, não se engana com isso. Você se acostumou com essa vida. Seu lugar não é aqui!
- Deco, eu não posso...
- Clara, casa comigo!
- O que?
- CASA COMIGO, Clara! Eu te amo!
- Deco!
- Eu te levo pra ver o mundo, Clara. Casa comigo!

~ Carta para nós dois

Confesso, em algum lugar me afeta ter que ouvir e rir de tudo isso. Talvez eu realmente quisesse estar em um lugar diferente do que estou.
Sua paixão é clara e, ainda que doce, explícita. Mas, mesmo assim, não cabe a mim corresponder. A verdade é que você não se encaixa nos planos que eu fiz pra mim e não acho que seja justo te aprisionar a uma vida que não te cabe meramente por capricho.
Não posso te privar de fazer outros planos, de querer alguém que te faça feliz, de me esquecer. Você é o tipo de pessoa que merece ter sempre um motivo pra sorrir. E deve buscá-lo, sim!
Mas o meu egoísmo me traz em amarras tão surreais, que me vejo sem direção quando penso em você.
Tudo o que sei é que te quero sempre sorrindo. Te quero a pessoa mais feliz desse mundo. Te quero meu eterno ombro amigo, meu porto seguro. Te quero comigo. Te quero.
Então descubro que, todo esse tempo, o meu maior defeito foi te querer.
Mas agora me parece tarde. Tarde pra mim, porque, ainda que aos poucos, você foi ocupando o seu coração e reduzindo o meu espaço dentro dele. Tarde pra você, porque, mais uma vez, no auge do meu egoísmo, eu te deixei de lado. Tarde pra nós, porque talvez já não haja mais tempo.
E o que nos resta quando não há mais tempo? Fugir? Fingir? Desistir?
Eu desisto, desisto de fugir e de fingir. E assumo: eu te quero aqui.
Estou na porta de casa, brincando com as chaves. Até quando você vai demorar?

domingo, 8 de agosto de 2010

La fleur volée

me trouxe uma flor roubada, daquelas que tem mais graça. colhida no jardim do vizinho. daquelas que pulam do muro, pedindo pra serem roubadas. levadas à amada que espera no portão.
me trouxe um sorriso discreto, daqueles que tem mais graça. no canto da boca, sem graça, sem jeito, com medo de não aparecer. daqueles que são os mais sinceros e mais contidos. levados à frente quando não se tem mais o que oferecer.
me trouxe um abraço verdadeiro, daqueles que tem mais graça. forte, sincero, único, apaixonado. daqueles que falam por si e não precisam de tempo para terminar. levados ao extremo quando se ama e não precisa mais de palavras.
me trouxe o seu coração. porque já tinha, nele, o meu.

~ das melhores lembranças

Eu parei pra me lembrar de tudo o que fomos até aqui. E só consegui sorrir. Porque mesmo as brigas e lágrimas derramadas vieram pra estreitar o laço e enfeitar e colorir a nossa união.
De tudo o que vivi com você, os sorrisos sempre foram a melhor parte.

E ela

Chegou com olhar perdido de quem não conhece o caminho que faz. Seus olhos buscavam alguém ou algum indício de estar na direção certa.
No abrir de uma porta, seus olhos se encontraram: a certeza do objetivo alcançado e o sorriso de acolhida. A tranquilidade tomou conta de seu pequeno coração.

Do não pertencimento

O que antes era vital, essencial, já me parece sobrar.
Se ontem não vivia sem os antigos, hoje, mais do que nunca, preciso dos novos.
Sinto as asas presas, atadas, limitadas. Nem os sonhos cabem mais por aqui. Preciso de liberdade, espaço, vida nova!
Que a saudade seja combustível para afastar o esquecimento. Mas que os novos ares sejam necessários e alimentem os sonhos e renovem as forças para as asas jamais se fecharem.
O coração permanece, mas a alma precisa sair. O mundo me chama, já não pertenço mais a este lugar.

Preciso!

Já não pertenço.
A parte de mim que existia aqui foi pra algum lugar que não sei onde.
Preciso dela pra sobreviver. Não sou eu, subexisto.
Alguém fechou a porta e senti pular pela janela tudo o que me prendia e trazia sorriso e fazia viver.
Quero de volta. Preciso!
Já não me reconheço neste lugar, nestas pessoas, nestes fazeres. Preciso de volta as minhas asas libertas, abertas, cobertas de desejos e planos e vontade de voar.
Não sou o que fui, sou menos. Preciso de mais! Preciso de volta as minhas forças e vontades de crescer.
Preciso abrir as asas e voar. E sempre que for preciso, ter um lugar para onde possa voltar. Preciso do mundo que grita de dentro de mim querendo encontrar o mundo que existe aqui fora e espera minhas asas e sonhos em algum lugar.

~ Carta para o melhor presente

Meu melhor,

escrevo-te para dizer o que já sabes, ainda que eu nunca tenha dito com todas as letras.
O meu coração só se acalma quando converso contigo. E conto tudo aquilo o que me aflige ou alegra em demasia.
Mesmo tendo outros amigos, que me conhecem há muitos anos, que cresceram comigo, que me viram chorar e sorir por todos os motivos... mesmo te tendo há pouco tempo do meu lado... mesmo tendo passado, contigo, por todas as coisas que somente nós sabemos que passamos, é em ti que vejo meu sorriso mais sincero, é contigo que sou, verdadeiramente, eu. Sem máscaras, sem armaduras, sem polimento ou qualquer tipo de disfarce.
Agradeço por confiares a mim teus segredos, por seres puramente quem és, por mostrares tua alma à minha e seres sempre aquele com quem posso contar.
Agradeço por seres meu melhor amigo, confidente, salvador, parceiro de samba e de mesa de bar, companheiro de caminhada e aventuras, mão para atravessar a ponte, ombro para chorar ou dormir, abraço, sorriso, olho brilhando, gargalhada.
E desejo que o que construímos até aqui supere a distância que o tempo tenta impor e todas as mudanças por que, inevitavelmente, passaremos.

Um beijo com todo o meu carinho,
Tua Morena.

Flores, amores e blablablá

chegou com flores roubadas do jardim da vizinha.
nunca fizera isso antes. era a primeira vez.
que motivo teria?
sabia que a chateação era tanta que não passaria com um beijo ou um simples pedido de desculpas ainda por telefone. e chegou com flores roubadas, só por ser diferente. só por ser romântico. só por mostrar que também sabia agir dessa forma.
pena a chateação não ter passado. seria cena de novela.
mas foi melhor assim. ficou de lição para a próxima vez. mesmo que se espere que tenha sido a última.

Das distâncias que o tempo impõe

Tenho medo do que possa ter me tornado depois de tudo o que vivi até aqui. Vejo os meus, aqueles que eram tão próximos e tão fáceis de ler, tão completamente diferentes do que eram nas minhas mais doces lembranças, que tenho medo de não ser mais sombra de quem eu era.
Distanciamo-nos, em tantos aspectos, do que fomos, que parecemos outras pessoas, nascidas em outras épocas, vivendo outras vidas. Será que nos tornamos aquilo o que nunca quisemos ou que sempre rejeitamos?
Sinto uma tristeza tão grande quando vejo que já não sinto o mesmo bem estar que pensava sentir, que sentia, que fora tão natural um dia.
As pessoas mudam, eu sei, mas a sua essência deveria permanecer a mesma. Sinto falta, não de uma pessoa especificamente, mas do que eu era e de como me sentia quando estava com esse alguém que já não reconheço mais.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Abandonado

Eis que a pior das sensações toma conta do meu coração: abandono. Com um agravante: permaneço cercado de pessoas que dizem sentir a minha falta e se importar comigo.
Mas pior que isso, eu sinto que você me troca pelas suas novas obrigações, novas amigas, novos sapatos... você me abandona quando eu mais preciso do seu carinho.

Carta para um bom amigo

Mon cher,

palavras jamais seriam suficientes pra dizer o carinho que eu sinto por você. Apesar da distância, de não nos vermos e, por vezes, mal nos falarmos, o coração compreende, perdoa e aproxima nossas existências.
Seguimos por trilhas tortas, muitas vezes paramos à beira do abismo. Mas é nesse momento que Deus se mostra presente, estende Sua Mão e coloca seus Anjos a nos proteger. A esses Anjos, chamamos, carinhosamente, amigos.


E foi você, meu caro amigo, que me segurou pela mão, olhou nos meus olhos e sorriu, trouxe cor, movimento e vida para minhas palavras e me mostrou que meu dom volta para o lugar de onde veio.
Saiba que eu estou aqui. Quando suas asas falharem, os pés calejarem e os joelhos não suportarem o peso do seu corpo. Eu estou aqui. Para te tomar pela mão, te levantar a cabeça, ampliar seu horizonte e mostrar que o Céu te espera o tempo que for necessário até que suas asas e seu coração estejam curados e preparados para o vôo da próxima missão.

Por todas as suas cores,
com todo o meu carinho.
je t'embrasse.
Poetisa.

A Mulher Árvore

Semente de uma flor caída do bico de um passarinho. Em meio à escuridão da terra, saiu em busca de luz. Cresceu, deu flor e enfeitou o caminho. Seus galhos se esgueiravam procurando alcançar o céu. No coração daquela árvore, um coração adormecia...
Era primavera. No meio do dia, um homem parou à sombra de suas folhas esperando repousar. Vinha sozinho, porém cantava. Parecia traduzir em sons o que sentia, pois não era compreensível o que ele dizia. E o doce som de sua voz despertou o coração que adormecia.


Abriu os olhos à procura de quem emitia tão lindo som que a despertara e se deparou com o homem que cantava. Perguntou-lhe quem era e o que o levara até ali. Ouviu como resposta uma voz suave feito brisa. Era um monge e tinha uma missão a cumprir. Andava tentando descobrir que missão seria essa. Curioso, quis saber como aquela bela mulher ficara presa ao tronco de tão frondosa árvore. Nascera ali, viera de uma flor. Mas até então não conhecera a luz do dia, adormecida ela permanecia.
E conversaram durante horas... conheceram profundamente um ao outro. Até que o monge se despiu de sua capa, abriu suas longas asas e voou. Cumprira sua missão de despertar a Mulher Árvore. Ela, por sua vez, sorriu e acenou para a liberdade que acabara de descobrir nos olhos do monge. Entendeu o sentido de estar ali e floresceu. Buscava o alto como o Monge Pássaro. E lá chegaria estendendo seus galhos para o céu.

a pedido de Carlos Valença, meu caro amigo.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Dos pequenos exercícios de caridade

Ajudar uma velhinha a atravessar a rua, levar livros antigos pra uma biblioteca pública, doar roupas que não cabem mais pra uma igreja, comprar brinquedos novos pra um orfanato, ouvir os velhinhos em asilos...
São as pequenas coisas que fazem um grande coração.
Caridade é exercício ;)

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Dos pequenos exercícios de amar

Nenhum dos amores platônicos foi tão idealizado. Nenhuma das paixões ardentes foi tão arrebatadora. Nenhum dos sonhos de princesa foi quisto tão real.
Há muito eu não sentia meu coração tão tranquilo. O que me faz sorrir é ver seus olhos brilhando quando me conta, entusiasmado, o que fez no dia. O que me deixa alegre é o seu jeito de sorrir. O que me acalma no fim de uma jornada, ainda que intensa, de trabalhos e rotina é o doce som da sua voz. O que me faz dormir melhor é ficar com o seu cheiro quando você deita no meu colo, como um gatinho, quase ronronando e pedindo carinho.
Há muito eu não sentia minha alma tão tranquila. O seu carinho, o seu toque, a sua respiração suave ritmando a minha me transportam pra uma outra dimensão. Onde eu não tenho problemas nem tarefas a cumprir. Só tenho você e o que quer que tenhamos vontade de fazer. Onde eu não tenho preocupação. Só uma: te ver feliz. Eu me transporto pro futuro e tudo o que ele vai ser de lindo quando formos, juntos, um. Eu me transporto pra nova vida que vamos levar. E sou mais leve por te ter comigo.
Há muito eu não sentia paz. E foi quando me encontrei em você que eu percebi que ela sempre esteve aqui, desde o dia em que te conheci.

Dos pequenos exercícios de memória

Não teve um segundo sequer que eu tenha parado pra pensar na minha vida, fosse lendo recados e cartas e cadernos antigos, vendo fotografias ou achando trabalhos antigos da época de colégio... (naquele tempo em que se registrava tudo no papel e se guardava) que eu não tenha sentido uma explosão de sentimentos que não tem nome me sairem do peito como borboletas em revoada a alcançar o infinito com suas pequenas asas.
O coração apertou, o sorriso não se conteve, a lágrima fugiu. Tudo isso, toda a minha história passou diante meus olhos como num filme que eu estivesse revivendo. E sorri. E chorei. E fui feliz mais uma vez.
E não teve um segundo sequer que eu tenha parado pra reviver a minha doce infância ou a minha atribulada adolescência em que você não estivesse presente. Você que estendeu a mão toda vez que eu caí, você que secou as lágrimas que insistiram em aparecer, você que buscou o sorriso no fundo do peito ou na beiradinha da alma, você que abraçou e pulou junto pra não sentir frio, você que ensaiou quadrilha pra ganhar ponto na escola, você que escolheu a minha roupa pra ir a uma festa, você que treinou handebol e sempre deu os passes perfeitos, você que fez caminhadas, você que me roubou um livro, você que fez reuniões na sua casa, você que levou metade da turma pra almoçar na casa do seu avô por conta de trabalhos, você que sempre foi a melhor dupla de buraco porque me entende só num olhar, você que me arrastou pra ir à praia, você que virou a noite conversando na internet (comigo ou com alguém por mim), você que riu alto no meio da rua como se não existisse ninguém mais em volta, você que nunca contou quem quebrou o vidro da janela, você que jogou bola na rua, você que jogou taco na rua, você que fez encontro de adolescentes, você que chorou no meu ombro, você que me poupou tempo ficando com aquele menino que eu queria e que não valia a pena, você que sussurou a resposta da questão mais difícil daquele simulado, você que achou a agenda que eu tinha esquecido e leu todos os meus segredos, você que comprou balas de hortelã todo recreio, você que correu atrás de pombos o recreio inteiro, você que andou o pátio inteiro procurando os meninos só pra vê-los de longe, você que me deu os piores apelidos, você que abriu polvo e frango no laboratório, você que vendeu açaí, você que passou as respostas dos exercícios daquele professor mala antes de começar a aula, você que revisou cada detalhe da matéria antes da prova, você que fez grupo de estudos na sua casa, você que andou de bicicleta na chuva comigo, você que me ensinou física, você que me apresentou a pessoas legais que estão na minha vida até hoje, você que se meteu em várias furadas junto comigo, você que só fez coisa errada esperando meus conselhos, você que foi à missa comigo, você que se declarou pra mim sabendo que não ia dar em nada, você que cantou no show de talentos, você que dançou no show de biologia, você que vendeu doce pra ter dinheiro pra festa de formatura, você que passou recreios escondido na sala tocando violão, você que escreveu músicas sentado no chão do pátio, você que jogou bolinha de papel no meu olho, você que levou bronca por minha causa, você que começou a guerra de estojos no meio da aula, você que pagou mico junto comigo, você que me matou de vergonha, você que voltou da escola andando comigo, você que dividiu o biscoito no recreio, você que emprestou a sua barbie, você que pisou no meu pé machucado, você que riu de mim quando engessei o braço, você que gritou comigo no telefone, você que disse que nunca mais falaria comigo e me ligou uma semana depois perguntando como tivemos coragem de ficar tanto tempo sem conversar, você que me escreveu cartas estando na carteira do lado, você que comprou caneta pra eu roubar do seu estojo, você que desenhou tudo o que eu quis, você que sentou na escada pra matar aula, você que levou vodka escondida no último ano da escola, você que me deu dinheiro na rua no trote, você que guardou todos os meus segredos desde o primeiro até os que ainda nem existem, você que sempre esteve aqui.
E não teve um segundo sequer que eu tenha parado pra admirar as pessoas que eu tenho na minha vida que eu não tivesse te visto do meu lado. Você que me conhece, às vezes, melhor do que eu. Você que me viu crescer. Você pra quem eu não tenho palavras.
Você que é meu amigo de infância.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O segredo II

[...]
Ele é um bom rapaz. Quieto, estudioso e carinhoso com os seus. Quase não sai, prefere se dedicar aos estudos. Está para ingressar na faculdade e não quer fazer feio.
Ele é tranquilo, nunca arruma confusão com ninguém e é até bem querido para quem seleciona a dedo os seus amigos.
Todos os dias segue a mesma rotina. Acorda e antes de qualquer outra coisa, liga o computador e checa seus emails. Toma um café da manhã de quem come por obrigação, lê o jornal e volta para o computador. Estuda como se estivesse em provas finais, ainda que esteja em férias.
À noite, conta estrelas de sua janela. Algumas vezes, se distrai com os gatos da vizinha, que insistem em pular no seu telhado.
O que jamais poderia imaginar era que se distrairia com outra coisa a partir daquela noite...
[continua]

sábado, 31 de julho de 2010

O segredo

Todos os dias acordava e cuidava do jardim e de seus gatos. Era gentil com os vizinhos assim como com suas plantas. Parecia um raio de sol.
Delicada, acompanhava a senhorinha da casa ao lado à feira na rua de baixo semanalmente e passeava com os cachorros do senhor da esquina a cada quinze dias. Sem receber nada em troca, apenas por prazer em ser útil.
Ninguém poderia imaginar que aquela doce menina guardava tamanho segredo. Ela o escondia muito bem.

[continua]

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Eu sei!

Eu tenho a cura para esse mal. Eu sei exatamente o que te deixa assim. Eu tenho a resposta para as suas dúvidas. Eu sei onde você pode encontrar tudo o que te falta.
Eu sou aquele que está sempre contigo. Eu sou o amor depois do último suspiro. Eu sou a luz da manhã. Eu sou a cor do pôr-do-Sol. Eu sou quem devolve o seu sorriso.
Eu entendo tudo o que você sente. Eu conheço cada dor que te aperta o peito. Eu seguro a sua mão quando você cai. Eu te acompanho quando você está só.
Eu sou aquele que ninguém vê, mas somente quem crê consegue sentir. Eu sou a cura para todos os seus medos. Eu sou o seu melhor amigo.

Acredite em mim!

Jesus

Sabe?

Sabe uma tristeza que não termina, uma angústia que vem e que vai, um aperto que fica no peito, nó na garganta, jeito sem jeito?
Sabe uma vontade de não sei, não quero, não vejo... nem ao menos desejo ter vontade?
Sabe um coração em desalinho, que só anda tristinho e sente tudo pequenininho?
Sabe um vazio que bate, uma falta que invade, um nada que arde?
Sabe aquela sensação de abandono, quase como um cão sem dono, que existe, mas já não tem mais lugar?

Jura que sabe?
Então me ensina a curar?

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Declaração

Não vou mentir.
Desde a última vez que ouvi sua voz ao pé do ouvido, não houve um dia em que tenha colocado a cabeça no travesseiro sem me lembrar das suas palavras, do seu sorriso sem graça, do seu jeito de falar. Você faz falta quando não está perto, me viciou, causou dependência, estragou a minha vida. Não sou a mesma desde o dia em que seus olhos atravessaram meu ollhar, seus dedos entrelaçaram os meus, sua boca tocou a minha. Já não tenho mais um dia de paz, já não durmo sem sonhar com nosso encontro. Já não quero mais viver sem você comigo.

Apenas uma canção

E mesmo depois de cinco (longos) anos desde a primeira vez, aqueles acordes ainda têm o mesmo poder de apertar e disparar este pequeno coração.
Toda vez que ouço aquela música, a nossa música, o coração dispara. Sinto um sei lá o quê que não tem controle e vem de dentro e parece que não passa nunca. E sei que você sente o mesmo.
Tudo o que vivemos e quisemos viver juntos ainda está por perto em algum lugar que somente nós podemos alcançar. Tudo o que desejamos ainda permanece por aqui. Tudo o que fomos pelos olhos um do outro sempre existirá.
Prometa que não vai desistir daquele sonho que, um dia, dividimos. Prometa que vai sempre pensar em mim. Prometa que vai permanecer aqui... no meu coração.

E toda canção que eles cantam toca o meu e o seu coração...

domingo, 18 de julho de 2010

O sonho II

[...]
Depois de quinze minutos de caminhada entre gozações e bebidas, eles chegaram à entrada da festa. Claro, à procura do maior número de mulheres solteiras que conseguiriam encontrar. Ele seguia com os amigos e fazia planos como eles. Bebia e gargalhava como se não houvesse amanhã. Mas, no fundo, o que mais queria era saber onde estaria a menina do short branco.
Ela estava a poucos metros da outra entrada da festa com as suas amigas que não queriam saber de homens, só queriam curtir a noite juntas. Mas não recusariam um belo sorriso e palavras carinhosas para colorir a noite ainda nublada. Com o cair da temperatura, ainda na casa de uma das amigas, colocou uma meia calça, uma jaqueta e trocou os tênis por um par de longas botas pretas. Mas o short branco a acompanharia até o fim da noite.
No meio da noite, acabaram por se esbarrar os olhares. Ela percebeu que um rapaz sorrira ao vê-las e comentou com as meninas. Ele viu que ela se aproximava com as amigas e deu um jeito de se separar dos amigos, que queriam lhe empurrar mais uma garota bebada como eles, com a desculpa de ir buscar mais uma bebida. E não voltou mais. Andou em direção à barraca de drinks em que elas estavam e pediu uma batida de morango. Não queria beber mais, precisava, mesmo, era de uma maneira de se aproximar. Não sabia o que dizer à moça que apenas vira passar, mas roubara seus sentidos e o deixara uma tarde com o pensamento nas alturas.
As nuvens se afastavam revelando um brilho nunca antes visto de estrelas que pareciam mais próximas da Terra. Além da Lua Cheia mais redonda que se pode imaginar, limpa, linda, prateada. Ele ainda segurava a batida de morango, sem tocá-la, e fixava, boquiaberto, a menina do short branco. Sem ter um amigo do lado pra avisar, ele só se deu conta de que parecia ridículo quando elas começaram a rir e olhar na direção dele. Tentou disfarçar, mas o máximo que conseguiu foi sorrir de volta.
Mesmo inconscientemente, conseguiu o que queria, o primeiro contato.
[continua]

Você não entende nada

Você nunca entende as minhas palavras.
Não faz questão de assumir que lê, mas não perde uma oportunidade de saber o que ando escrevendo.
Você nunca entende as minhas palavras.
Não sabe perceber a sutil existência de imaginação, acha que tudo é realidade e não existiriam disfarces que escondessem em poesia o que escrevo.
Você nunca entende as minhas palavras.
Talvez tenha inveja por não conseguir escrever ou recalque por não se reconhecer nem entrelinhas.
Você nunca entende as minhas palavras.
E por mim está tudo certo. Eu nunca escrevi para você.
Você nunca entende as minhas palavras.
E tenho certeza de que nunca vai entender.

O sonho

Caminhava como quem vai a uma festa. Nem tão arrumada, nem tão desleixada. Apenas ela, indo a uma festa. Escolhera muito bem as roupas que usaria num dia como aquele. E apesar da chuva, não sentia frio com as pernas à mostra num short branco e as costas semi à mostra numa blusa preta.
Ele a vira passar em frente ao bar em que estava com os amigos, quando ainda ia para casa. Com um jeans e uma camiseta que não escondiam sua beleza, mas não a destacavam tanto assim. Ela ainda era apenas ela voltando de um dia cheio de coisas para resolver.
Ele parou com o copo a caminho da boca, que se abria conforme ela passava, e a acompanhou com o olhar. Os amigos brincavam e riam dele. Mas ele só queria acompanhar aquela menina tão bonita que passara por ali. Queria ir atrás dela. Mas não foi. A conta do bar chegou e ele voltou à realidade. Pagou a sua parte e, ainda pensando naquela menina de rabo-de-cavalo, foi para casa se arrumar. Era dia de festa da cidade e marcara de reencontrar os amigos dali a uma hora para irem juntos.
Ela, já em casa e enrolada na toalha depois de um banho relaxante, escolhia as roupas que usaria. Ia encontrar as amigas, pois iriam juntas para a festa da cidade. Depois de um dia tão cheio, tudo o que ela precisava era de uma boa dose de diversão com as amigas.
Uma hora depois, ele esperava os amigos no local marcado de se encontrarem. Antes que os dois últimos chegassem, ela passou por eles. Dessa vez, todos olharam e não se contiveram em pensar, mas verbalizaram o que viam. Assobiavam e mexiam com a moça que parecia não ouvir. Ele, que continuava pensando nela como vira mais cedo, pareceu não acreditar no que seus olhos viam. Ela conseguia ficar ainda mais bonita. E parecia hipnotizado pelo movimento dos quadris dela.
Os amigos perceberam e aumentaram as brincadeiras e risadas às custas do jeito como ele olhara pra ela mais uma vez.
Tendo chegado os dois amigos atrasados, seguiram para a festa debaixo de gozações. Os atrasados, chamados de noivos por demorarem para se arrumar. Ele, taxado de apaixonado pela moça que passara.
Ela encontrou as amigas e comentou do grupo de rapazes que mexeram com ela minutos antes. Elas riram e concordaram que os homens sempre agem da mesma forma. O que ela não sabia é que cruzariam mais uma vez o caminho deles.
[continua]

domingo, 11 de julho de 2010

Flor

E desde a primeira vez que em que os olhares se cruzaram, toda vez que se encontram a cena se repete: olhada de cima a baixo, ela percebe quando ele tenta disfarçar. E ainda há disritmia, ainda é o mesmo olhar, compaixão que não se esgota nem desvia.
De volta ao ninho, apesar de já não tão livre assim, o  Bem-Te-Vi parece enxergar na Flor o sentimento novo que ela carrega no peito. Talvez seu desejo mais profundo seja ser como ela, que apesar de enraizada, mudou o jeito de ver o mundo e a liberdade quando se entregou a um lindo Beija-Flor.
Não trocam palavras, não há comunicação que ultrapasse o limite do breve contato visual. Mas alguma vezes, não é preciso mais que uma troca de olhares...

e o headphone?

fita no tornozelo
(ele) direito
(ela) esquerdo

brinco na orelha esquerda.
óculos escuros guardados em algum lugar.
ombros (dela) e pés (de ambos) à mostra.

há coisas fora do lugar.

olhar maroto, disfarçado.
sorriso escondido no canto da boca.
cachos e tranças mal distribuídos (entre os dois).
(ele) nitidamente hipnotizado.
(ela) levemente superior.

há coisas no seu devido lugar.

o ar do inverno distorce a Praia.

domingo, 4 de julho de 2010

as dores do mundo

a dor consome
generalizada
invade cada canto
de carne que luta
para deixar de sangrar.

o peito aperta
sufocado
e nada alivia
por mais leve
que seja o pesar.

o corpo já não responde
falta o ar
e a vontade some
parece adivinhar
que o cansaço
é atadura dos movimentos
mais vitais.

a dor, o sufoco e
o cansaço reinam,
generalizados,
atando o corpo
à falta de ar
e de vontade
da carne
que luta por alívio.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

L'Archidiacre

Ele sempre fora sério, centrado, focado nas coisas de Deus. Filho único, logo cedo abandonou a casa para ir ao seminário. Ainda padre, já à cidade, e celebrando missas na Catedral, recebeu uma encomenda inesperada certa noite em meio a um temporal. Um pequeno embrulho esquecido às longas portas da igreja chamou sua atenção. E o recolheu.
Em seu quarto, atrás da sacristia, abriu o pacote que se remexia pensando se tratar de um pequeno animal. Mesmo tendo aberto o embrulho, ainda demorou um tempo até mudar de opinião. O ser que o fitava com olhos lacrimosos era um pequeno bebê, abandonado por alguém que teve a mesma reação que o jovem padre ao vê-lo: horror.

Com o passar do tempo, as deformações da criança lhe pareciam normais e ele a tratava com carinho. Depois de uma certa idade, já alfabetizado e exímio leitor, já que nunca saíra da Catedral, o padre nomeou o adolescente 'Tocador de Sinos da Catedral'. Não por amor. Também nem por obrigação. Mas talvez por pena.
Alguns anos maias tarde, foi ordenado Bispo. E os sinos da igreja soaram jubilosos pelas mãos de seu pupilo. O que ele não esperava era que, na estação seguinte, seus instintos carnais há tanto tempo adormecidos seriam despertados na Festa dos Tolos...

domingo, 20 de junho de 2010

Lucas.

Ela me telefonou dizendo que lera meu texto e se interessara. Disse que via a trama se desenvolver diante seus olhos a cada linha. E que, talvez por descuido (não sabia se meu ou dela), acabou nos reconhecendo (a ela e a mim) no meio daquelas personagens tão irreais que tomavam cor, forma e vida em minhas palavras através de seus olhos.
Disse que gostou dos escritos e queria transformar tudo num filme. Sem nem mudar cenários ou pessoas. Durante os primeiros 15 minutos de conversa, não tive oportunidade de dizer mais que o 'oi' ao atender à ligação. Ela estava decidida e não queria outra resposta que não um sim. Teatral e exagerado, com toda a empolgação que ela sentia, mas sabia que eu não compartilhava.
Esperei até ela parar de falar para recuperar o fôlego e respondi, antes que ela continuasse. Respondi o que ela queria ouvir e a deixei sem reação. Andréia sabia que tudo o que eu sempre escrevi em meus livros eram retalhos da nossa vida a dois. De tudo o que vivemos e, também, do que não aconteceu. Usava nomes e situações quaisquer que ninguém que lesse reconheceria a não ser ela, Andréia, mesmo depois de tanto tempo separados.
Depois de algumas tentativas em vão, desistiu de tentar falar qualquer coisa e me ouviu. Expliquei que cederia os direitos e permitiria as filmagens da maneira como ela quisesse, que não interferiria em nada, que sequer leria os roteiros, disse que confiava no trabalho de sua renomada e reconhecida equipe. A única condição para transformar minhas raras palavras em imagens era que ela não voltasse a me telefonar.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Tudo depende.

Depende do meu estado de espírito.
Depende da caneta.
Depende do papel.
Depende do humor.
Tudo depende!
Mas não importam as condições: independente de tudo isso, as palavras nunca morrem dentro de mim.

Conversas quaisquer podem acender uma faísca de palavra que mora dentro ;)
Você ainda vai escrever assim...

Contrastes

Queria alguma coisa salgada e quente. Parei na sorveteria.
Tudo o que eu mais precisava era de uma companhia. Não aguentei esperar.
Detesto chamar a atenção. Sentei na primeira mesa e pus os pés na cadeira da frente.
Senti uma vontade imensa e incontrolável de chorar. Abri o caderno e escrevi.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Não.

Mesmo depois de tanto tempo, a conversa fluiu quase que naturalmente. Talvez em função de toda a naturalidade aparente, acabou por tomar um rumo que não devia, ainda que fosse esperado...
- E você? Ainda me ama?
Ela gelou. Sentiu o coração bater no fundo do estômago e na garganta ao mesmo tempo. Não esperava que a questão fosse exposta tão explícitamente. O que responderia? Nem pensou, foi sincera:
- Não sei responder.
- Não sabe ou não quer?
- Não sei, juro que não sei!
- Então isso é um não?
- Não é...
- Mas também não é um sim.
- Também não...
E um silêncio eterno de dois segundos perfurou ambos os corações. E ele inisitiu.
- Só responde se você me ama.
- Ah, não me olha assim...
Mesmo através da tela, os olhos entristecidos dele marejavam os dela. Respirou fundo.
- Se você não tem coragem de dizer, eu digo. EU TE AMO! Mesmo depois de tanto tempo sem te ver, sem te tocar, eu ainda carrego comigo aquele sentimento de quando nos conhecemos. Ainda me lembro do seu gosto e do seu cheiro. Ainda penso em você da mesma forma. Ainda quero ter você do meu lado.
Não se conteve. Antes que se debulhasse em frente à câmera, o interrompeu:
- Mas éramos tão adolescentes! O que poderíamos fazer? Você consegue me dizer?
- Não sei. E já não importa mais. Hoje não somos mais adolescentes...
- E o que podemos fazer?
Dessa vez, o silêncio foi maior e mais pesado que o anterior, dilacerando os corações expostos àquele sentimento tão antigo e tão presente. De um lado, a saudade de tudo o que não foi vivido. Do outro, um coração solitário implorando por carinho.
A inquietação tomou conta e não conseguiram mais controlar as palavras...
- Diz que você ainda me ama. Eu posso sentir. É real. Eu sei que é real.
- Não.
- Diz...
- Não. Estou dizendo: não.
- O que?
- Estou te respondendo. Não. Não te amo.
Ele ficou atônito. Não esperava uma resposta negativa. Aliás, nem esperava uma resposta tão rápida e muito menos decidida. Não soube o que responder.
- Mas...
- Como eu posso amar uma pessoa que não conheço?

(continua)

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Príncipe

Teu cabelo dourado é meu raio de sol.
Meu céu são teus olhos azuis.
A luz que ilumina meu dia vem do teu sorriso.
Vem, faz de mim tua princesa,
me toma pela mão e me leva além desse mundo.

I feel you.

E todo rosto que eu vejo na rua tem os teus traços, o teu olhar, o teu sorriso, o teu jeito.
E toda voz que me chama com carinho é a tua dizendo que me ama.
E toda lágrima que faz meu coração doer cai dos teus olhos e afoga os lábios teus.
E todo pesadelo teu é minha noite em claro, velando teu sono.
E todo vazio que eu sinto no meu dia é falta de ti.

domingo, 13 de junho de 2010

Gibiers de potence

Condenado à forca, o Poeta entristeceu-se. Não poderia mais transitar livremente pelas ruas da cidade recitando suas canções e poemas às belas mulheres por que passasse pelo caminho.
Vagava sem rumo pela noite, entristecido, cabisbaixo e sem vontade de seguir. Não cantava, não compunha, não dançava, não escrevia, não sorria... não tinha forças para ser alegre. Seguia triste.
Até que um rouxinol abriu as asas sobre ele e lhe trouxe de volta as cores da vida. Esvoaçante, a Cigana tomou o Poeta pela mão e dançou com ele. E dessa dança nasceu um lindo girassol. E o Poeta sorriu.


Desde então, não parou mais de sorrir e de compor. Livre do destino cruel, o Poeta vivia cada dia como se fosse o último, único dia de sua vida, e já não chorava mais. Aprendera o sentido real em se viver e acompanhar o colorido dos dias.
E toda noite, madrugada ou manhã, quando se deitava, antes de dormir, o Poeta se lembrava daquele girassol que nasceu do rodopio da saia da Cigana...

Saudade

A chuva que molha o rosto é de lágrimas. O frio que impede o sono é a solidão. Juntos, ensinam o significado não das palavras, mas de todo sentimento.
Estar só não significa não ter ninguém, mas mostra o quanto é vital estar perto.
Ao menor sinal de carinho, o coração acelera, as mãos gelam, as pernas tremem, falta o ar... e o peito é preenchido por uma sensação sem nome, sem descrição, sem tradução.
Ao somatório de tantos sinais, mesmo sem ainda compreensão total, ao longo dos séculos, se tem chamado saudade.

sábado, 12 de junho de 2010

Quer me namorar por um dia?

Imagine se você pudesse voltar no tempo e fazer uma coisa diferente.
Imagine se você pudesse ser minha mais uma vez.
Imagine se nós tivéssemos fugido juntos naquele dia.
Imagine como seria diferente.

Imagine se eu estivesse batendo na sua porta agora, com um buquê de rosas.
Imagine se eu te abraçasse.
Imagine se estivéssemos juntos agora!

Vem abrir a porta pra mim?

segunda-feira, 7 de junho de 2010

- what if...

Ela está sempre insatisfeita. Não sabe o que quer. Ou sabe: quer tudo! Quer sempre o máximo, sempre o melhor.
Não quer ter que escolher. Ainda assim é seletiva. Não quer tudo o que aparece, sabe escolher. Quer tudo o que lhe interessa.
Se arrepende de algumas escolhas que não pode voltar atrás, mas abraça de corpo e alma as oportunidades que tem de crescer e ser melhor.
Ela tem potencial, ela sabe o que pode fazer. E faz!
Muitas vezes se pega pensando no que poderia ter feito se abrisse mão de uma vontade por outra. Chega a se chatear um pouco... mas o que move seu mundo é o pensamento do que aconteceria se ela não tivesse tanta vontade.

terça-feira, 1 de junho de 2010

O beijo

E no meio de uma briga, depois de ouvir coisas que jamais imaginara, ele a segurou com carinho e firmeza e a beijou.
Resistente, ela tentou fugir, mas ele insistiu e ela cedeu. Se rendeu ao carinho maior que a fizera se apaixonar perdidamente e esqueceu toda a raiva que sentia.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Les Gargouilles

Choro. Tenho o coração apertado, entalado no peito. Mal respiro. Soluços me consomem desde o começo da noite. A lua brilha intensamente e as estrelas são como inúmeros olhos a me observar de todos os lados.
No chafariz da praça, ao redor de suas inquietas águas, os Ciganos se reúnem e dançam. A alegria daqueles corpos livres me entristece. Por isso choro.
Além das minhas Marias adormecidas, não tenho outra companhia que não as Gárgulas do alto da Torre da Catedral. E a elas me dirijo.


Mesmo sem dizer palavra, as Gárgulas me ouvem e parecem compreender a minha dor. Vivem o mesmo sofrimento de não poder sair dali e dançar na alegria dos Ciganos que habitam a praça.
Presos, incorporados à Torre da Catedral, as Gárgulas e eu não temos outra escolha além de observar. E desejar estar ali. E invejar aqueles seres livres que rodopiam, festejam, se alegram e mais que tudo: vão aonde querem.

Sim.

Eu vivo o universo que você cria.
Eu sou aquela que nunca corresponde.
Eu sei cada sentimento que passa pelo seu coração.
Eu estou aqui, mesmo que você diga não.

Em resposta a um estímulo vindo de um canto qualquer.

sábado, 22 de maio de 2010

O Tocador de Sinos

Me reconheço rejeitado. Não fui bem quisto já quando nasci, abandonado à porta de uma Catedral, ao relento. Semi coberto pela neve que caía, fui recolhido quase morto por uma alma caridosa, alguém que cuidou de mim, me ensinou os primeiros passos, as primeiras palavras, a ler, escrever e ser parte do que sou hoje.
Não me sinto completo. Carrego dentro de mim coisas que não sei explicar. A vida inteira ouvi dizer que não posso ser como as pessoas que vejo passeando pela praça.


Do alto da torre, admiro um mundo do qual não faço parte. Ainda que seja parte dele.
Sinto um bater no peito que não cessa, uma dor que me faz insone, uma vontade de não conheço o que...
Não tenho de que reclamar. O Arcebispo me acolheu em sua casa e me ensinou a ser o que hoje sou: o Tocador de Sinos da Catedral. Não tenho amigos, não converso com ninguém além das gárgulas das torres ou as Três Marias, minhas únicas companheiras de caminhada.
Pesadas como a disformidade que trago nos ombros, elas são as únicas que não têm medo de se aproximar. Os sinos da Catedral são minha válvula de escape...
Mas hoje é o dia da Festa de Reis. A trupe de ciganos está na cidade e eu vou descer pra acompanhar. Quem sabe não me traga um pouco de alegria para os dias frios e tristonhos que tenho vivido?

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Arte pela Arte

A minha Arte não segue tendência,
não se encaixa em movimento,
não vem nem vai na corrente.

A minha Arte não é pra ser analisada
nem pra ser rotulada
muito menos estudada.

A minha Arte é livre,
é expressão do vento,
certeza líquida,
cor da voz.

A minha Arte é Arte.
Nada além da própria Arte
que segue o movimento dos dedos
segurando a caneta
que desliza no papel.

~ Carta para você

Querido,
não podemos continuar como estamos. Não vejo mais sentido em ficarmos juntos. Você ainda é meu favorito. O problema é que eu não consigo mais sentir aquela tranquilidade que eu sentia do seu lado.
Depois que soube da sua decisão, não pude conter as lágrimas e a dor que me invadiu o coração e saiu pelos poros, tão forte que era. Sei da sua necessidade de partir, mas ainda não compreendo a sua pressa. Só respeito. Faça o que achar melhor e conte com o meu apoio. Mas não conte com a minha presença.
Me dói dizer, mas já não sinto mais a velha obrigação de cuidar de você. Me parecem inúteis os meus conselhos, você não os ouve. Ou não os quer ouvir. Então prefiro guardar.
Também me escapa a alegria de te contar coisas novas. Você já não se alegra comigo. Ao contrário, me entristece com a sua tristeza.
Sofro por tomar, também, a minha decisão. Tão radical quanto a sua: não quero mais!
Não quero mais me desgastar pra tentar te mostrar uma nova maneira de olhar o mundo ou de agir diante das coisas que te acontecem. Não quero mais me culpar pela sua insônia ou falta de alegria ou falta de vontade. Não quero mais me preocupar com o que dizer, tendo que imaginar qual será a sua interpretação de cada palavra, solta ou em conjunto com todas as outras em tudo o que eu quero dizer. Não quero mais sofrer, por antecipação ou não, por causa de você!
NÃO QUERO MAIS!
Se é pra haver despedida, que não espere até a sua ida, estendendo a dor de uma iminente partida.
Se é pra haver despedida, que seja agora, porque eu não quero mais.
Mas estarei sempre aqui: quando for necessário.

Com saudade e carinho,
Morena

~Bibelô

Passando os olhos por uma vitrine, me encantei por um pequeno bibelô em formato de anjo. Era pequenino, porém suas asas eram longas e imponentes. Uma graça!
Não resisti e levei o anjinho para casa. Tinha um lugar na estante do meu quarto que o acolheria muito bem. E foi lá que o coloquei.
Mas o bibelô era teimoso. Apesar do lugar privilegiado, estranhamente, o anjo insistia em não permanecer no lugar. Por diversas vezes o recuperei antes que chegasse ao chão.
Até que, um dia, quando cheguei em casa depois de uns dias fora, encontrei o meu pequeno bibelô caído atrás da cortina, quase que escondido. Depois de muito procurar, descobri o que havia acontecido: meu delicado gato persa, em busca de um passarinho que entrar pelo vão da janela, arrastara tudo o que não vira pela frente com sua cauda gorda.
O ajno foi ao chão imediatamente e sua asa esquerda se partiu. Mesmo depois de tanto tempo, consegui colar quase todas as partes e refazê-lo. Era um bibelô, não tenho dúvidas, mas ele parecia demonstrar gratidão. Passou um tempo (que poderia ser o de recuperação) na estante onde o coloquei, mas pareceu se cansar dali e voltou a se atirar nos meus braços toda vez que me via. Até que não tive mais paciência para o bibelô teimoso que não se contentava com as prateleiras em que estava e insistia em não permanecer no seu lugar.
Guardei o bibelô na cristaleira e não precisei mais me preocupar. Ele continuava à vista mesmo sem estar onde eu gostaria que ele ficasse. Mas, apesar da teimosia, o carinho que eu tinha por ele nunca foi diferente.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

~ da falta que a falta faz.

Sinto falta de quando era pra mim que você corria quando acontecia qualquer coisa, por mais idiota que fosse.
Sinto falta das mensagens de madrugada que eu sempre via de manhã e te ligava correndo pra saber se estava tudo bem.
Sinto falta de quando a minha opinião era importante pra você.
Sinto falta de quando a gente andava na praia e tomava sorvete no fim do dia só pra passar o tempo.
Sinto falta de quando a gente matava aula pra tomar cerveja e rir da desgraça que era a nossa vida.
Sinto falta de quando você me abraçava e dizia que nada no mundo ia separar a gente.
Sinto falta de quando você vinha me buscar em casa só pra andar de bicicleta no meio da tarde.
Sinto falta de quando você me ligava pra falar nada e tinha coragem de dizer que estava com saudade e queria só ouvir a minha voz.
Sinto falta de quanto você parava o que estava fazendo só pra me fazer rir.
Sinto falta de quando a gente conversava e ria alto no meio da rua sem se importar com a hora ou o lugar.
Sinto falta de quando a gente se encontrava nos intervalos e ficava conversando pra sempre.
Sinto falta de quando a gente ouvia as músicas do meu mp3. Ou pelo menos parte delas. Ou só as que você gostava.
Sinto falta de quando eu era a melhor sua companhia de samba. Porque você sempre vai ser a minha.
Sinto falta de quando eu olhava toda a vez que a porta abria e depois que você chegava, eu nem ouvia mais a porta abrir.
Sinto falta de quando você deitava na minha perna naquele banquinho da praça e eu te fazia carinho no cantinho da nuca.
Sinto falta de quando era de mim que você sentia falta.

Não, mas...

não era engraçado, mas já que você riu, não vou lhe privar o prazer de uma gargalhada há muito escondida atrás de tanta tristeza.

~ distância

Você está aí, mas eu não estou aqui.
Não dessa vez.
Não pra você.
Não por enquanto.

Você está aqui, mas não parece nem aí pra mim.
Eu que sempre estive aqui pra quando você quisesse...

Você está aí e eu estou aqui.
A distância não permite que estejamos no mesmo lugar.

Você está aqui e eu estou aí.
E tenho certeza de que isso nunca vai mudar!

Fantasia

porque eu quero mais é viver no Carnaval.
sair por aí pulando pela rua, sorrindo, cantando e vivendo a fantasia de alguns poucos dias que me tiram os pés do chão e os problemas da cabeça.

eu quero mais é viver no Carnaval.
fazer amigos de infância em meia hora e guardá-los com carinho no meu coração.
tomar cerveja dos outros como se fossem parte de mim.
dividir o taxi com uma estranha e encontrar conhecidos na barca.

eu quero mais é viver no Carnaval.
quebrar a rotina, sair da realidade, ser quem nunca me permitiriam ser nos dias que não são Carnaval.

eu quero mesmo é viver o Carnaval.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Sonho de menina

Eu sou romântica à moda antiga, do tipo que ainda espera o príncipe encantado. Só serve pra mim aquele que me trata como uma verdadeira princesa, que me faz surpresas, que me manda flores... O cara perfeito é o que me leva pra andar de pedalinho, pra ver o pôr-do-sol na beirinha do mar ou me leva ao cinema no meio da tarde... E nas raras vezes em que nos desentendermos, ele vai continuar me olhando com carinho e respeito, vai me calar no meio da briga com um beijo de novela e dizer que me ama escondendo uma lágrima no canto dos olhos. E, no dia seguinte, vai ligar só pra dar bom dia e dizer que me ama. Vai me buscar em casa pra um passeio de bicicleta no fim de semana, vai me escrever cartas e enviar postais quando estiver longe, mesmo que suas viagens não durem mais que dois dias. E quando voltar, vai correndo me encontrar só pra dizer que morreu de saudade e que não sabe viver sem mim. E nós vamos fazer planos, vamos querer morar numa casa enorme com um lindo jardim e muito espaço para os nossos filhos brincarem. Quando chegar a hora, ele vai me achar a grávida mais linda e me dizer que eu serei a melhor mãe do mundo! E desde o primeiro dia só haverá tempo bom. Ele vai me amar e eu não vou conseguir nem respirar longe dele. Já saberemos que fomos feitos um para o outro no instante em que cruzarmos os olhares e as borboletas revoarem no estômago.

|keep dreaming|

domingo, 9 de maio de 2010

Estrela Verde

O Poeta segue seu caminho errante pelas ruas da cidade.
Ele vai levando cor e alegria aos corações que esbarram no seu. Na mão direita, sempre uma rosa vermelha pronta a ser ofertada à mulher que lhe amar olhando o fundo de sua alma que salta aos olhos. Na mão esquerda, todos os sentimentos que vêm do coração daquele amante medieval se transfiguram numa estrela verde.


Vermelha porque é paixão. Verde porque é esperança.
O Poeta, apaixonado pela vida, traduz amor e poesia e música nas trovas repletas de esperança numa vida melhor a cada dia que passa, seguindo no seu caminho errante pelas ruas da cidade.

cinco minutos

eu fico impressionada com a capacidade que você tem de me irritar. em cinco minutos todo o amor que declarei escorre por água abaixo. como se nada do que foi dito antes tivesse valor, ou como se eu falasse pras paredes. você não atende aos meus telefonemas, não me busca nem me leva em casa, não percebe que eu pintei as unhas de azul e cortei o cabelo chanel. você não se importa se está tarde e eu não sei voltar pra casa. você não sabe os meus horários nem os lugares que freqüento e não conhece os meus amigos. você não me faz surpresas, não manda flores, não me leva ao cinema nem se esforça pra me agradar. tem dias que eu pareço acordar do lado de um ser estranho. será que você me conhece o suficiente? será que eu sou tão difícil de conviver? e depois de outros cinco minutos, pedimos desculpas e volta o mesmo amor de brilhar os olhos que deixamos guardado durante tanto tempo.

só o seu

o seu amor me ataca
me invade
me inunda
me cerca
me afoga
me tira os pés do chão
me faz ser quem nunca esperei
me faz sentir a única mulher que merece ser amada.
o seu amor me faz sentir o sangue correr pelas veias
o ar entrar nos pulmões
a vida pulsar no meu peito.

saudosismo

às vezes a vida me dói num pedacinho que não sei explicar
não tem cura nem remédio
não tem solução.
esse pedacinho que dói é vermelho e bate
e alguns a ele chamam coração.
não sei se é mesmo coração
pra mim, mais parece saudade
daquelas coisas que podem nem ter acontecido,
mas é saudade, ou sei lá,
aquele sentimento de que ainda falta alguma coisa
um sentimento sem descanso que atrapalha a rotina bate-bate do coração.
um pedacinho de saudosismo que vem e vai e fica no coração.

La Cour des Miracles

Numa noite iluminada pela Lua, saindo do Cabaré, o Poeta se viu num lugar pelo qual não costumava passar, cercado de pessoas que não costumava encontrar e que ele não conhecia. Eram os Ciganos, estrangeiros que pediam asilo a qualquer vila que os acolhesse. E a cidade do Poeta os havia recebido, de olhos fechados e portas entreabertas.
Detido pelos Ciganos sob acusação de invadir um território que não lhe cabia, o Poeta não teve oportunidade de se justificar. Os estrangeiros não o conheciam, logo não se sentiam culpados de privar as ruas da cidade da poesia apaixonada daquele eterno amante da Lua.
Acordou um tempo depois, ainda desnorteado, e não estava sozinho, porém os olhos que o observavam eram mais doces que os que os aprisionaram. Os olhos verde esmeralda da Cigana tinham um misto de compaixão e carinho ao admirar o Poeta deitado em seu colo, semi desperto, de peito nu e longos cabelos cobrindo o rosto.
Mais uma vez, seus caminhos se cruzavam e o Poeta se via nos braços daquela que lera sua mão e tocara seu coração.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

La Gitane

Ela se faz poesia para os olhos que a vêem,
ritmo para o corpo que a toca,
música para os ouvidos de quem a ama.

 A Cigana se entrega suavemente a um amor inesperado por aquele que salvou a sua vida.
O Tocador de Sinos alcançou a sua alma quando a olhou nos olhos pela primeira vez.
E hoje ela reflete o sentimento daquele olhar profundo por onde passa, irradiando amor no colorido dos movimentos leves de sua dança.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

O Poeta

Ele caminha pelas ruas da cidade, vivendo na boemia, amando todas as mulheres, cantando suas dores de amor.
O Poeta é o príncipe das ruas, respeitado e desejado como nenhum outro, nem mesmo o Soldado do Rei.
A magia da sua poesia alcança as estrelas e o coração das mulheres da cidade.


Às mulheres do amor, o Poeta oferece suas palavras em troca de carinho e calor humano nas noites frias.
Às vendedoras da feira, oferece sua música em troca do pão de cada dia.
Às mulheres dos seus sonhos, fora do alcance de suas mãos, oferece serenatas noite adentro em troca de sorrisos sinceros, mesmo à distância, através de suas janelas e sacadas.
O Poeta segue conquistando corações por onde passa. O que não espera é que seu coração seja, um dia, conquistado por outra que não a sua amada Lua, ou sua companheira boemia.
Até que, um dia, seu caminho se cruza com o de uma estrangeira, errante como ele, que o desperta para um novo modo de olhar o mundo e encarar o amor.
No momento em que leu o destino do Poeta na palma de sua mão, a Cigana tocou o seu coração.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Abre as asas sobre nós...

Liberdade é algo que vai além do que podemos alcançar nessa humanidade que temos.
Somos tão humanos, mas tão humanos que, mesmo livres, não sabemos que o somos. E buscamos sempre mais.
E é essa sede por mais, essa busca desenfreada por liberdade, que nos leva em frente e nos faz ver o mundo de possibilidades que bate a nossa porta todos os segundos.
Liberdade é mais que um sentimento, é uma razão de viver.
E só se alcança quando se tem algo de que se desprender.


Liberdade é desprendimento. Liberdade é desapego. Liberdade é sensação.
Liberdade é algo que buscaremos incessantemente, eternamente, constantemente. E seremos livres mesmo que não saibamos.
Liberdade é um abrir de asas transformador. Liberdade é elevação de alma.

Obrigada pela inspiração, amiga. Veio de um simples scrap.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A Carta

Resolveu escrever-lhe uma carta contando tudo o que sentia. Estava angustiada com aquele turbilhão de sentimentos explodindo em seu pequeno coração e resolveu compartilhar.
Afinal, ele era o único que conseguiria entender o que ela sentia. Estavam juntos há tanto tempo que bastava um olhar pra ele saber do que ela precisava. 
Estava feliz e queria que ele soubesse que seus sorrisos eram a causa de tanta felicidade.
Ele estava longe, mas mesmo assim ela sabia que ele sorriria e se lembraria dela. E que a abraçaria quando chegasse como se houvesse acabado de ler as palavras dela. 
Na carta, não dizia muita coisa diferente do que ele estava acostumado a ouvir de sua boca no dia-a-dia, mas seus sentimentos escorriam pelos dedos até o papel. Dizia pouco, mas com tamanho significado que poderia ser apenas uma frase, mas como peso de uma enciclopédia.


Ela só queria deixar registrado o quando o amava e o quanto ele sempre fora importante em sua vida.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Pedra preciosa

Tomou por marido o Poeta para salvá-lo de destino cruel.
Tomou pela mão o Soldado e o tirou dos braços de sua amada.
Tomou o caminho do Arcebispo e desviou seus olhos do Céu.
Tomou o coração às mãos e não soube que caminho seguir. Seu destino não a prendia ali, a levava além, ao horizonte, ao alto. O alto da Torre.
Seu coração a guiou até as Três Marias.
O Tocador de Sinos a observava pelos vitrais da Catedral, desde que cruzara as portas do templo. Ele não esperava olhá-la nos olhos, tão de perto, sentir o calor de sua respiração a o macio de sua pele em seus braços.
A bela Cigana não pôde conter o espanto ao mirar, através de um embaçado espelho, aquela figura disforme olhando para ela. Cobriu a boca com as mãos e abafou um grito de pavor. Se aproximou devagar enquanto ele se escondia nas trevas. Acariciou-lhe o rosto com as pontas dos dedos. Ele se assustou e a segurou pelos braços. Ela olhou dentro dos olhos dele. E se amaram através daquele olhar.
Se entregaram a um abraço terno e intenso. E a noite seguiu, silenciosa.


Acordou sozinha, coberta por pétalas de girassóis. Vozes graves e passos pesados a despertaram do sonho para a realidade que vivia. Procuravam por ela.
Com o coração na boca, pôs suas vestes e desceu correndo as escadarias da Torre. Não sem antes olhar, mais uma vez, para o sol que iluminava a Igreja através dos magníficos vitrais.
A trupe com que viera se despedia da cidade com festa e música, mas ela não podia sair dali. Finalmente encontrara o seu lugar. Ao mesmo tempo que ouvia seus amigos em festejos, se lembrava dos nomes que diziam os homens que procuravam por ela na Torre. E entristeceu-se. Não poderia continuar lá. Tinha de seguir com a trupe.
E a cigana partiu. Com o coração na mão e a lembrança doce do carinho de seu Tocador de Sinos.

A moça do vestido de flor

Não vejo a hora de te ver passar por mim, distraída, com os cabelos longos soltos ao vento, o vestido florido esvoaçante e o sorriso encantador que me tirou os pés do chão desde a primeira vez que eu vi.
Não, você não sorriu pra mim sequer uma vez, nem sabe da minha existência, mas meu coração vive aos saltos na esperança de te ver passar do outro lado da rua novamente.
Não sei onde você mora, de onde vem nem pra onde vai, sei que enfeitou meu dia ao dobrar a esquina no meio da tarde, quando eu olhava de esguelha o movimento na praça.
Fiquei paralisado com tanta suavidade que passava por mim, como brisa a me beijar os olhos lentamente.
Não quis saber de mais nada que não seus olhos verde-esmeralda e sua pele cor de jambo que me enfeitiçaram.
Não vejo a hora de te ver passar por mim com seu sorriso encantador que me tirou os pés do chão.

A morte numa taça

Injustiça.
Acusam-me erroneamente de um crime que cometi. Assumo, sou culpado. Mas as acusações são infames!
Carrego a culpa de trazer comigo a luz dos deuses e partilhá-la. Sou acusado de causar trevas ao partilhar a minha luz.



Injustiça! Infâmia!
Devolvam-me o direito à luz.
Não me permitiram defesa, amarraram-me pés e mãos, calaram minha voz, trouxeram-me a morte numa taça e bebi. Envenenei-me de sabedoria e a luz ofuscou-me as vistas.

(quadro A Morte de Sócrates, por Jacques-Louis David)

quinta-feira, 29 de abril de 2010

La Zingara

Pele morena. Longos cabelos negros. Olhos verdes.
Vestido e lenço de seda vermelha dão vida aos movimentos suaves de sua dança. Argolas, anéis, colares e pulseiras de ouro seguem o ritmo da música que ela acompanha com os pés descalços.
Ela não pertence àquele lugar. Aquela praça é apenas passagem no caminho da bela moça.
Ela não pertence a lugar nenhum. Veio das montanhas e segue em direção ao horizonte. Ela segue as batidas do seu coração e caminha... caminha para nunca mais voltar ao ponto de partida.
Quer se encontrar. E só vai parar de caminhar quando estiver no lugar a que seu coração pertencer.
Lê o destino dos passantes na palma de suas mãos e dança para conseguir algumas moedas afim de continuar o seu caminho.
O que a bela moça não sabe é que o brilho de seus olhos e o movimento dos seus pés e quadris encanta os homens que a vêem dançar.
Do Arcebispo ao soldado do Rei, todos desejam a oportunidade de passar ao menos uma noite ao seu lado. Mas, de todos os homens que a cortejaram, somente por um o coração dela bate mais forte. Aquele que foi coroado tolo diante da cidade, aquele que é diferente, aquele que nunca foi amado... aquele que soa os sinos do alto da torre.

Pesar

A solidão e o vazio que ousaram se aproximar dela tomaram lugar onde não devia, no coração.
Ela sente a tristeza de não ser mais quem era e não agir como gostaria que fosse.
Ela sente o peso de decisões duras que precisou tomar.
Ela sente a fraqueza humana que a impede de seguir em frente.
Ela tem medo de não conseguir sair do fundo do poço em que caiu quando escorregou no orgulho que trazia no peito.
Ela se perdeu... não sabe mais se vai voltar.

domingo, 25 de abril de 2010

rompante

estava quase dormindo e despertei. as palavras me escapoliam feito borboletas raras. e não podia perdê-las. saí da cama num salto, busquei papéis e caneta. sempre em tempo de registrar os pensamentos fujões. comecei a escrever... perdi o sono.

sábado, 24 de abril de 2010

pensamentos soltos

Às vezes me pego pensando naquele telefonema que eu nunca recebi, nas cartas que nunca me foram escritas... nas palavras que nunca foram ditas.
Outras vezes penso nas mensagens que nunca enviei ou nos pensamentos que nunca contei.
Me lembro dos beijos que não aconteceram e das mãos que se soltaram, dos dedos que nunca mais se entrelaçaram.
E é quando me vejo afogada nesses pensamentos, que percebo a falta que você me faz.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Rotina

Ciclo. Os dias começam e terminam com a mesma preocupação: acionar o despertador. Algumas poucas horas para repor fisicamente as energias e menos horas ainda para recarregá-las espiritualmente. O trabalho e as atribuições diárias da vida adulta nos impõem novos hábitos e maneiras de ver o mundo. Crescer faz parte. Mas a poesia sempre existirá. Jamais se perderá porque não fez sol ou por causa do excesso de calor. A poesia é o que sempre haverá.

Uma breve resposta à querida Vanessa.

sábado, 10 de abril de 2010

Penso nela...

Hoje eu me peguei pensando na Mônica de novo. Aquela menina nunca me saiu da cabeça...
Ela mora na casa da frente. E toda vez que passa pela janela, mesmo com as cortinas fechadas, me pego admirando.
Lembro como era na época do colégio... todos os meus amigos me perguntavam como eu conseguia andar com aquela garota estranha, mas eu ainda não via a Mônica como uma garota, essa é a verdade. Demorei a perceber que ela usava saias! Mas ela, também, não fazia muita questão de parecer uma garota.
Na adolescência ela se transformou, virou um mulherão. Aí sim, todos os caras queriam saber como eu andava com ela e porque ela me dava tanta bola. Mal sabiam eles que o que eu mais queria depois que me dei conta de que ela era uma garota, era que ela, realmente, me desse bola. Mas ela me via como o amigo de sempre.
Crescemos juntos, sempre fomos amigos, sabíamos de tudo o que acontecia com o outro... eu sempre adorei conversar com ela. Inventei uma paixão pra ver qual seria a reação dela e ela riu. Disse que isso aconteceria mais cedo ou mais tarde e me contou que também gostava de alguém. Fez suspense de menina e até hoje não sei quem é. Deve ter sido o primeiro namoradinho que ela teve, um tal de André. O que esse cara nunca soube é que, poucos dias antes de beijá-la, era eu que segurava a mão dela, abraçava e tocava seus lábios delicadamente. Foi o melhor pôr-do-sol da minha vida!
Desde sempre trocamos confidências. A única coisa que eu nunca tive coragem de contar pra Mônica era o que eu sentia por ela. Ainda sinto. Mas pelo jeito não vou poder fazer nada. Ela já está de namorado novo e não me dá mais a mesma atenção de antes, ele ocupa boa parte dos horários livres dela. Até os almoços!
Mesmo assim, saímos juntos e conversamos como sempre. Ainda somos bons amigos...
Acho que preciso arrumar alguém pra passar o tempo até esse novo romance da Mônica ser antigo. Pelo que eu conheço dela, esse é outro namoro que não vai durar...

cidade sorriso tristonho


chora a cidade sorriso...

a tristeza está no ar
quem quer que passe
sente
perto ou longe da dor
quem quer que passe
por onde quer que passe
sente

chora a cidade sorriso...
chuva de lágrimas
mar de dor

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Cidade Sorriso

chora a cidade sorriso
e suas lágrimas escorrem aos montes
formando cachoeiras de sofrimento profundo

chora a cidade sorriso
se desespera por não poder mais sorrir
as poucas forças que restam
se perdem no chorar

chora a cidade sorriso
coração apertado
nó na garganta
tristeza

chove a cidade sorriso.

Vontade de Chumbo

A nova história da Bailarina e seu Soldado

Bailarina e Soldado se conheceram num dia de muito calor na Loja de Brinquedos. O Casarão estava com todas as suas portas e janelas abertas e do jardim da frente chegavam o perfume das flores e algumas serelepes borboletas que vinham colorir o ambiente.
Menos querido que os outros soldadinhos, o Soldado de Chumbo resolveu passear pela Loja, no seu ritmo, diferente da euforia dos seus companheiros que se exercitavam, correndo em círculos. E foi nesse passeio que o Soldado de Chumbo avistou a Bailarina. Ela dançava no alto da estante, na sua reluzente Caixinha de Música.
Foi com uma certa timidez que ele se aproximou da Bailarina e começou as primeiras conversas. No início, ela dançava como se não o visse. Mas com o tempo, passou a gostar daquela companhia que há muito lhe observava de forma tão gentil.
Ela era leve. Alçava vôos bem altos. Almejava ser livre. Tudo o que a Bailarina mais queria era se libertar das suas dores e poder sair da Caixinha de Música. Mas, assim como o peso de chumbo do Soldado, ela tinha suas amarras que não a permitiam ser feliz por inteiro. Seus vôos mais altos eram seus melhores sonhos e seus piores pesadelos. Porque, quando ela acordava e percebia que estava no mesmo lugar, com um de seus pés sempre atados à Caixinha de Música, perdia a vontade de dançar, de repetir aqueles mesmos movimentos de todos os dias.
Ele tinha um peso a mais. Era de chumbo. Não flutuava como a Bailarina. Mas mesmo assim, se apaixonou pela insustentável leveza daquele ser de longas pernas, que dançava gratuitamente, quase pedindo para ser admirada. E ele admirava. Não somente a dança, mas a Bailarina e suas longas pernas.
Se apaixonaram e não foi uma história de amor como as dos contos de fadas. Poucos brinquedos aprovaram a aproximação dos dois e eles começaram a desconfiar se aquilo daria certo. O Soldado não se comportou como a Bailarina esperava e ela se decepcionou com ele.
Depois de um tempo juntos, ela decidiu se separar dele e voltar ao alto de sua estante. Ele, entristecido, não conseguia entender o motivo da separação. E sofreu. Sofreu porque não sabia mais o que fazer. Estava entregue a um sentimento que não existiria mais. Até que decidiu seguir em frente. E uma certeza ecoava dentro dele: "se libertar das amarras do medo não é fácil, nem impossível. É necessário."
E quando ele se libertou, se tornou mais leve que a Bailarina. Marchou, dançou, rodopiou com a Boneca de Pano, mas mais que isso: com todo o seu peso de chumo, o Soldado flutuou... e ela não entendeu como isso podia acontecer. A Bailarina não soube mudar como o Soldado e continuou presa à sua vida de Caixinha de Música. Soldadinhos iam e vinham perto dela. Mas passavam. E ela continuava lá, presa à sua vida de Caixinha de Música.
E ao contrário do que se pensa, a Bailarina e o Soldado de Chumbo foram felizes para sempre... separados. Cada coração encontrou um novo sentido, nele se firmou e seguiu rumo. Um por cada estrada, traçando, ambos, novos caminhos e buscando, a cada passo, uma eternidade que não se constrói. Ele, a cada passo de sua marcha. Ela, em cada passo de sua repetida dança.
E foi assim que o Soldado de Chumbo percebeu que o que batia dentro dele e às vezes o sufocava, se chamava coração.