quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Pão e água.

Descobriu num breve sorriso que já não se lembrava mais daquela combinação de números que tanto relutara em esquecer um dia. Era um sorriso frouxo, aquele que costumava escapar quando se recordava dele. Era mais que alegria, ultrapassava a satisfação. De qualquer maneira, precisava, naquele instante, ouvir a sinfonia torta de grave-agudo que a voz dele representava. Era trabalho. E aprendera que trabalho, como água, não se negava a ninguém. Não se identificou, apesar de telefonar de um número estranho e, até então, por ele desconhecido. Começou a falar como se houvessem se visto há pouco. Ele titubeou, mas depois da primeira meia dúzia de palavras, reconheceu o doce som daquela voz que tanto sonhara, tempo atrás, ter ao pé do ouvido sempre às primeiras horas do dia. Por um segundo distraiu-se, fez que não ouviu o que ela dizia e a sentiu respirar mais fundo antes de repetir o que dissera. Era trabalho. Precisava se concentrar. Anotou as informações que ela passou e prometeu uma data pra entregar o que devia. Desligou com a sensação de dever cumprido. Não precisaria mais telefonar por um bom tempo. Esquecera a combinação. Sentia escapar um breve sorriso.