sábado, 22 de maio de 2010

O Tocador de Sinos

Me reconheço rejeitado. Não fui bem quisto já quando nasci, abandonado à porta de uma Catedral, ao relento. Semi coberto pela neve que caía, fui recolhido quase morto por uma alma caridosa, alguém que cuidou de mim, me ensinou os primeiros passos, as primeiras palavras, a ler, escrever e ser parte do que sou hoje.
Não me sinto completo. Carrego dentro de mim coisas que não sei explicar. A vida inteira ouvi dizer que não posso ser como as pessoas que vejo passeando pela praça.


Do alto da torre, admiro um mundo do qual não faço parte. Ainda que seja parte dele.
Sinto um bater no peito que não cessa, uma dor que me faz insone, uma vontade de não conheço o que...
Não tenho de que reclamar. O Arcebispo me acolheu em sua casa e me ensinou a ser o que hoje sou: o Tocador de Sinos da Catedral. Não tenho amigos, não converso com ninguém além das gárgulas das torres ou as Três Marias, minhas únicas companheiras de caminhada.
Pesadas como a disformidade que trago nos ombros, elas são as únicas que não têm medo de se aproximar. Os sinos da Catedral são minha válvula de escape...
Mas hoje é o dia da Festa de Reis. A trupe de ciganos está na cidade e eu vou descer pra acompanhar. Quem sabe não me traga um pouco de alegria para os dias frios e tristonhos que tenho vivido?

2 comentários:

Ju Fernandes disse...

não há dúvida !
ciganos são ciganos.
Alguns acham que são apenas ciganos.
Mas por onde eles passam deixam alegria,
com todos dançam,
de par em par.

Neylan Porto disse...

adorei o texto, tem bastante semelhança com o que venho pincelando por ai...